Juiz da Infância e Juventude defende reavaliação das penas de maus tratos a crianças e adolescentes
- Alexandre Ribeiro Carioca
- há 1 hora
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Magistrado da Vara da Infância e Juventude de Rio Preto, Evandro Pelarin, diz que penas são menores do que as que punem agressões a gatos ou cachorros
O Juiz da Vara da Infância e Juventude de São José do Rio Preto, Evandro Pelarin, defendeu no novo episódio do IPAM Talks, podcast do Instituto Paulista de Magistrados (IPAM), uma reavaliação das penas referentes a maus tratos à criança e ao adolescente, que são inferiores às que punem os maus tratos aos animais.
“O Estatuto da Criança e do Adolescente apresenta princípios como o do artigo 5º, que diz que a lei punirá severamente os atos de discriminação, de omissão aos direitos fundamentais da criança e do adolescente. No entanto, embora com algumas mudanças recentes, nós temos situações que são muito difíceis de entender. Por exemplo, uma agressão com lesão corporal simples, no Código Penal, tem uma pena menor do que os maus tratos a um gato ou a um cachorro. Em um cenário de maus tratos com lesão a uma criança a pena é muito menor que na lei de proteção aos animais”.

O programa está no site e no canal do IPAM no YouTube e pode ser acessado na íntegra aqui.
Durante o programa, o magistrado abordou questões que envolvem a segurança e a proteção das crianças e adolescentes na sociedade, o papel do juiz da Infância e Juventude nessa “missão” e a necessidade de uma melhor avaliação do sistema de proteção aos menores.
O juiz Evandro Pelarin também destacou a importância do Projeto Eu Tenho Voz, do IPAM, que segundo ele tem feito a diferença nas escolas públicas de Jundiaí com a apresentação da peça “Marcas da Infância”, que ensina crianças e adolescentes a se protegerem.
“O Estatuto da Criança e do Adolescente impõe ao juiz da Infância e Juventude um papel singular no sistema protetivo. Há um artigo, o 146, que não encontramos similar em nenhuma legislação no Brasil, que diz que o juiz da Infância e Juventude é a autoridade máxima. Então a provocação e a invocação que a Lei faz no papel do juiz da infância e juventude no sistema socioeducativo e protetivo é singular no ordenamento jurídico. Tanto que o juiz dessa instância tem a possibilidade de instaurar, ele mesmo, os procedimentos verificatórios e de proteção sem depender da provocação de advogados, promotor, defensor público ou polícia. Então esse pressuposto da atuação jurisdicional eleva o papel do juiz e o sobrecarrega com essas responsabilidades”, afirma Pelarin.
Segundo Pelarin, “a lei obriga o juiz da Infância e Juventude a fazer todos os elos entre todos os atores do sistema protetivo: Polícia, Conselho Tutelar, Ministério Público, Defensoria, OAB, comunidade, instituições não governamentais, poder público municipal, e todas as secretarias. Há o artigo 88 que fala do serviço que diz respeito ao socioeducativo que tem de estar concentrado em um lugar só. Eu diria que o juiz da Infância e Juventude teria de se mover, cumprir uma missão, ou seja, tem de sair do Fórum, participar das reuniões, das ações vivas na comunidade e dos eventos comunitários, conversar com as pessoas na rua, firmar relações sociais, ser um verdadeiro missionário”.
O juiz Pelarin falou também sobre os diversos canais para encaminhamento de denúncias de maus tratos a crianças e adolescentes, para o sistema protetivo agir com maior rapidez. “As leis referentes à primeira infância estabelecem que não há um canal único de denúncia para que as autoridades de proteção possam agir. Qualquer pessoa pode denunciar um abuso, uma agressão a uma criança ou adolescente no Conselho Tutelar, na Polícia Civil, na Polícia Militar, na própria Vara da Infância e Juventude. Qualquer órgão é porta aberta para recebimento dessa denúncia. E o Disque 100 é uma importante porta federal, onde se acaba encaminhando para as localidades as denúncias, porque todos nós temos o dever de fazer o encaminhamento de uma denúncia às autoridades”.
O magistrado lembrou ainda sobre a urgência das causas que envolvem o sistema protetivo das crianças e adolescentes, que faz com que a atuação do Juiz da Infância e Juventude vá muito além do processo. “As causas que envolvem a criança e o adolescente, em grande parte, são causas urgentes e emergentes. Temos que ter uma atuação rápida e ligação com aquela autoridade que tem de cumprir determinada conduta ou acolhimento para o Conselho Tutelar, enfim, nós temos de manter esse contato permanente e conversar bastante com a comunidade e também com o Estado”.
Por fim, o juiz Evandro Pelarin falou sobre a importância do Projeto Eu Tenho Voz do IPAM nas escolas de Jundiaí: “O Projeto Eu Tenho Voz é um instrumento muito interessante para que nós possamos ter relatos espontâneos de eventuais abusos e violências a crianças e adolescentes. Por meio da apresentação da peça Marcas da Infância, com atores profissionais, uma peça muito bem escrita, nós observamos nas escolas o efeito impressionante que ela realiza com as crianças e os adolescentes. Nós nos interessamos e pedimos que o IPAM nos ajudasse, e o IPAM nos atendeu prontamente. E estamos aqui em Rio Preto já no quarto ano com o Projeto Eu Tenho Voz, onde nós selecionamos as escolas para que haja a apresentação teatral. Mas não podemos só provocar as crianças a relatar a violência e depois disso nada acontecer. Então nós estruturamos a nossa Vara nesse sentido, com psiquiatras, psicólogos e assistentes sociais voluntários, para com essa ajuda darmos andamento nos casos”, concluiu o entrevistado.
Sobre o IPAM – O Instituto Paulista de Magistrados é uma associação civil de cunho científico e cultural, sem finalidade lucrativa, idealizada para valorizar o Poder Judiciário e a Magistratura. Foi fundado em 8 dezembro de 1999, por 21 juízes de primeiro grau, com o objetivo de contribuir para o aperfeiçoamento das instituições democráticas, defender as prerrogativas e a dignidade dos magistrados e propor demandas coletivas na defesa desses interesses. Está sediado na cidade de São Paulo e conta atualmente com mais de 1 mil associados, entre membros titulares, colaboradores e honorários. Desenvolve estudos dos direitos internos e internacionais, promove pesquisas, promove projetos socais em defesa dos Direitos Humanos e edita livros e revistas que favoreçam a divulgação da ciência jurídica e da cultura em geral; realiza eventos e debates sobre temas relacionados à magistratura e projetos em parceria com outras instituições visando fortalecer a sociedade e esclarecer informações sobre a posição e as atribuições dos profissionais do Judiciário, além de promover cursos de capacitação e aperfeiçoamento profissional.