"É ainda Necessária a Igreja?" - artigo do Padre Valdair Aparecido Rodrigues Administrador
É ainda necessária a Igreja?
Quando cursava Teologia, no segundo ano, fui surpreendido nas primeiras aulas de Eclesiologia com a leitura de um capítulo do livro “Igreja, povo santo e pecador”, do professor Pe. Álvaro Barrero, SJ. O título era justamente este: “É ainda necessária a Igreja?”
Dada a realidade da hipermodernidade, são comuns afirmações como “Jesus Cristo sim, Igreja não”, “Jesus Cristo sim, Igreja também”, além de, infelizmente, um acelerado processo de indiferença não só à Igreja, mas ao próprio Jesus Cristo.
Levemos em consideração que a Igreja é totalmente referida a Jesus Cristo. A Igreja possui estrutura e estruturas, carisma e instituição. As estruturas estão a serviço da estrutura, assim como a instituição a serviço do carisma. Dessa forma, podemos responder à indagação temática desse artigo com outro questionamento: que tipo de Igreja é necessária ou não?
A Igreja é estruturada em Deus. O carisma procede de Deus. Para os cristãos, Deus é entendido como comunidade perfeita de amor. O amor é relação, é comunhão, é proposição e não imposição. É dom que se dá na gratuidade para ser acolhido na liberdade. Por ser estruturada em Deus, a Igreja é Santa.
Mas a Igreja possui estruturas e precisa se institucionalizar, pois ela é conduzida por seres humanos. Abertos à revelação e à graça divina, os seres humanos acertam, mas também falham. Por isso, as estruturas, a instituição eclesial precisa se colocar sempre em processo de metanoia (conversão) para reconduzir-se de acordo com a vontade do seu fundamento: Jesus Cristo.
Disso emana a necessidade de apresentarmos o tipo de Igreja que se faz necessária nos tempos atuais. A Igreja das pompas, do sucesso, da teologia da prosperidade e da retribuição, das aparências, da imposição, da falta de comunhão, nunca foi e nem correspondeu à Igreja de Jesus Cristo.
Se em Deus está o princípio, a origem e o exemplo da Igreja, e esta é chamada a refletir a Luz de Cristo, ela só será de fato a Igreja que torna presente o seu Senhor, à medida que, em sua vivência comunitária da fé e em sua teologia, prevalece a dinâmica da Kênose, isto é, o esvaziamento, o sair de si para doar-se a outrem. Jesus Cristo, sendo rico, se fez pobre por amor a nós, com o objetivo de nos enriquecer com sua graça (2 Cor 8,9).
Isso requer da Igreja tornar-se ícone da comunhão divina, pautando-se em ter os mesmos sentimentos de Cristo Jesus (Fl 2,5). Dele, que não se apegou a ser igual a Deus, mas tornou-se servo obediente até a morte na cruz. Portanto, as estruturas e a instituição eclesial precisam promover estilo de vida comunitário, dialogante, alimentando a vivência da koinonia, ou seja, comunhão, vida fraterna, onde o amor se torna transbordante, a ponto de transformar todas as realidades existenciais em que estamos inseridos, criando assim um novo estilo de sociedade.
Sendo assim, essa Igreja apresentada é, sim, absolutamente necessária, pois ela se torna sinal eficaz da salvação de Deus para o mundo, advertindo e apontando o verdadeiro caminho. E, à semelhança divina, não é uma Igreja impositiva, mas propositiva, ecumênica, sinodal e pautada em concílios, cuja finalidade é a de conciliar (unificar/ integrar) os seres humanos entre si e com Deus, fazendo prevalecer o shalom divino, ou seja, a paz, a plenitude de vida, através das estruturas e instituição eclesial que a tornam missionária, boa samaritana, pobre junto aos pobres e que, em Cristo, é sócio-transformadora.
Padre Valdair Aparecido Rodrigues
Administrador Paroquial – Catedral de Jales